O Cine Salê foi um projeto educacional desenvolvido entre 2009 e 2014, que teve como objetivo integrar o cinema ao ambiente escolar, utilizando-o como uma ferramenta pedagógica para a formação crítica dos estudantes. O cinema, com seu aparato tecnológico apropriado para documentar, encenar e narrar histórias, construiu uma nova maneira de olhar para o mundo, permitindo que os indivíduos compreendessem outras realidades, criassem vínculos afetivos e se percebessem como parte de um contexto mais amplo e complexo. Como destaca Edgar Morin (2001), a educação deve favorecer a compreensão do mundo para que os indivíduos possam atuar de forma mais consciente e responsável na sociedade.

Ao longo de sua existência, o Cine Salê buscou proporcionar aos alunos contato com a linguagem cinematográfica por meio de filmes que abordavam valores fundamentais como tolerância, justiça e solidariedade. Segundo Paulo Freire (1987), “a leitura do mundo precede a leitura da palavra”, e, nesse sentido, o cinema se mostrou uma ferramenta poderosa para ampliar a percepção dos estudantes sobre diferentes contextos sociais e culturais. Dessa forma, o projeto não apenas utilizava o cinema como recurso didático, mas o colocava como um meio para desenvolver a análise crítica e a conscientização dos alunos em relação às temáticas trabalhadas.

Princípios Pedagógicos

O Cine Salê se fundamentou em princípios pedagógicos que valorizaram a educação como um processo dinâmico e transformador:

  • Alfabetização audiovisual: a educação não pode se restringir ao ensino da linguagem verbal e escrita, sendo essencial incluir a leitura crítica de imagens e produções audiovisuais, considerando o impacto dessas linguagens na sociedade contemporânea (MARTIN-BARBERO, 2006).
  • Formação crítica e cidadã: o cinema, como linguagem artística e cultural, permite aos estudantes refletirem sobre questões sociais e políticas, fortalecendo o pensamento crítico e a cidadania ativa (BAJTIN, 2011).
  • Interdisciplinaridade: o projeto integrou conhecimentos de diversas disciplinas, permitindo um aprendizado mais amplo e contextualizado (SANTOMÉ, 1998).
  • Autonomia do estudante: inspirando-se na pedagogia freireana, o projeto incentivou os alunos a construírem seu próprio conhecimento a partir da experiência cinematográfica e do debate coletivo (FREIRE, 1987).

Objetivos do Projeto

O Cine Salê estabeleceu como metas:

  1. Incorporar o cinema ao currículo escolar, utilizando-o como ferramenta pedagógica para enriquecer o processo de ensino-aprendizagem.
  2. Desenvolver a competência crítica para a leitura de imagens, permitindo que os alunos compreendam os significados implícitos e explícitos nas narrativas audiovisuais.
  3. Fomentar o debate sobre temas sociais, políticos e culturais, incentivando a reflexão e o diálogo sobre diferentes perspectivas de mundo.
  4. Estimular o protagonismo dos estudantes, tornando-os participantes ativos na seleção e análise dos filmes exibidos.
  5. Conectar o conteúdo curricular ao universo cinematográfico, criando pontes entre as disciplinas escolares e as representações audiovisuais da realidade.

Assim, o Cine Salê não se limitou a exibir filmes como recurso didático complementar, mas se configurou como um projeto que inseriu o cinema na prática educativa de forma estruturada e intencional. Como reforça Alain Bergala (2008), a educação cinematográfica deve ser encarada não como um mero entretenimento, mas como um instrumento essencial para desenvolver a sensibilidade e a capacidade analítica dos alunos.

Mesmo após sua descontinuação em 2014, o legado do Cine Salê permanece vivo na lembrança de seus participantes e na compreensão de que a educação e o cinema são formas de socialização e construção do conhecimento. O projeto demonstrou que a experiência cinematográfica pode ampliar horizontes e contribuir significativamente para a formação integral dos estudantes, possibilitando-lhes um olhar mais crítico e sensível sobre o mundo que os cerca.

“O essencial é saber ver, saber ver sem estar a pensar.” (FERNANDO PESSOA)

Referências

BAJTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2011.

BERGALA, Alain. A hipótese-cinema: pequeno tratado sobre a transmissão do cinema dentro e fora da escola. Rio de Janeiro: Bookman, 2008.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

MARTIN-BARBERO, Jesús. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. Rio de Janeiro: UFRJ, 2006.

MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.

SANTOMÉ, Jurjo. Globalização e interdisciplinaridade: o currículo integrado. Porto Alegre: Artmed, 1998.

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