Tornar-se um educador inclusivo não é um ato de chegada, mas um compromisso permanente com o inacabamento, como diria Paulo Freire. É preciso abandonar a zona de conforto dos planejamentos homogêneos e das avaliações padronizadas para abraçar a complexidade de ensinar a sujeitos diversos, com tempos, histórias e modos de aprender radicalmente diferentes. O educador inclusivo é, antes de tudo, alguém que se recusa a aceitar que o sistema está pronto — ele sabe que a escola precisa ser redesenhada a cada estudante que entra por seus portões.
É um equívoco comum tratar a inclusão apenas como uma adaptação metodológica para estudantes com deficiência. A inclusão verdadeira é mais profunda e mais ampla: ela implica uma mudança de olhar. Ela nos exige abandonar a lógica do “normal” e do “desvio” — aquela que divide alunos entre os que “dão conta” e os que “atrapalham o ritmo da turma”. Um educador inclusivo entende que não há ritmo único, e que ensinar bem é justamente ajustar-se às diferentes velocidades. Isso não significa diluir o conteúdo ou abaixar as expectativas. Significa, antes, reinventar as formas de acessar o conhecimento.
Nessa reinvenção, escuta e curiosidade são ferramentas tão importantes quanto os livros didáticos. Conhecer os alunos é um ato pedagógico. Não basta saber o nome, é preciso saber do que riem, com o que se entristecem, como se expressam. Um aluno que não fala, por exemplo, pode ter muito a dizer — se o educador estiver disposto a escutar com outros sentidos. A Língua Brasileira de Sinais, os recursos de comunicação alternativa, as tecnologias assistivas são pontes, mas só funcionam se a escuta for genuína.
Essa escuta exige formação, sim, mas também exige ética. Não se trata apenas de participar de cursos ou acumular certificados. Trata-se de cultivar um olhar sensível, capaz de reconhecer que a diferença não é um obstáculo à aprendizagem, mas sua condição. O filósofo francês Jacques Rancière, ao refletir sobre a ideia de emancipação intelectual, defende que todo ser humano é igualmente inteligente — o que muda são os caminhos que se percorrem para aprender. Um educador inclusivo parte dessa premissa: todos podem aprender, desde que lhes sejam garantidos os meios adequados.
Mas esses meios não brotam do improviso ou da boa vontade. Eles exigem trabalho coletivo. A inclusão não é uma responsabilidade individual do professor, mas uma construção institucional. Uma escola que se pretende inclusiva precisa revisar seus currículos, flexibilizar suas práticas avaliativas, acolher as famílias como parceiras e investir em equipe multidisciplinar. Quando uma criança é excluída da experiência escolar — seja por barreiras físicas, comunicacionais ou simbólicas — o que fracassa não é o aluno, mas o projeto de educação.
E, no entanto, mesmo diante de tantas exigências, ser um educador inclusivo é, paradoxalmente, um dos caminhos mais potentes de reencontro com o sentido do ensinar. É nas pequenas vitórias — o aluno que finalmente lê em voz alta, o que compreende um conteúdo porque você usou um recurso visual, o que se sente respeitado pela primeira vez — que o professor redescobre a alegria pedagógica. Porque quando a escola acolhe a diferença, ela se humaniza. E educar, no fim das contas, é um gesto de humanidade.






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